TEORIA/AÇÃO E CELEBRAÇÃO DA VIDA
Paula Lima |
"Aquelas de nós que estão fora do círculo do que essa sociedade define como mulheres aceitáveis, aquelas de nós que foram forjadas nos caldeirões da diferença – aquelas de nós que somos pobres, que somos lésbicas, que somos Negras, que somos velhas – sabemos que sobrevivência não é uma habilidade acadêmica. É aprender a estar sozinha, impopular e às vezes insultada, e a fazer causa comum com aquelas outras identificadas como externas às estruturas, para definir e buscar um mundo no qual todas nós possamos florescer. É aprender a tomar nossas diferenças e torná-las forças" [1].
(LORDE, 1984)
Estudar a Diáspora na posição de Negra inevitavelmente gera momentos de recolhimento, de raiva e desesperança. Isso porque a história de violência é vivida o tempo todo, ela atravessa as relações, as escolhas, as crenças. Em alguns momentos, ter a vida norteada pela consciência do fato (racialização, racismo, sexismo, gordofobia, homofobia) pesa além da conta. Em maior ou menor grau, nós temos uma alma saqueada em reconstrução; além disso, há pessoas que tentam nos dissuadir da luta e gozam de privilégios o tempo todo. As vezes, parece que as coisas não vão mudar, que não tem saída, não tem jeito. Nesses momentos, eu me forço a parar e relembrar do sentido da luta, da resistência plena que consiste em cuidar tanto de dentro, quanto de fora.
Sobreviver é um ato político [1], mas não é apenas no sentido de não tirar a vida ou não "deixar" que a tirem, mas de saúde mental, de aprender a amar e viver a solidariedade; de ter a vida em ordem [2], de não desistir, e de cuidar de si mesma [2]. Num dia ruim desses, eu tive a ideia de ouvir o acústico MTV do Gilberto Gil e, então, aquelas verdades lidas suspenderam o caráter imediato, por questão de sanidade; elas deram lugar à seriedade, à paz interior, à dignidade, e, principalmente, ao que Marisa Monte chama de "celebração da vida através da Música" [3].
Sobreviver é um ato político [1], mas não é apenas no sentido de não tirar a vida ou não "deixar" que a tirem, mas de saúde mental, de aprender a amar e viver a solidariedade; de ter a vida em ordem [2], de não desistir, e de cuidar de si mesma [2]. Num dia ruim desses, eu tive a ideia de ouvir o acústico MTV do Gilberto Gil e, então, aquelas verdades lidas suspenderam o caráter imediato, por questão de sanidade; elas deram lugar à seriedade, à paz interior, à dignidade, e, principalmente, ao que Marisa Monte chama de "celebração da vida através da Música" [3].
A militância política, em geral, nos leva à ênfase no problema, à supressão de certas camadas de subjetividade, o que tem sido essencial para estarmos aqui vivas [2]. Por outro lado, toda a teoria/ação [4] às vezes é priorizada a ponto de reduzir um aspecto essencial: a sobrevivência deve ser plena. Precisamos nos curar constantemente e nos atentarmos para o futuro. Há momentos em que resistir e sobreviver é parar tudo e ouvir as nossas necessidades, físicas, emocionais e estéticas. É reerguer. É ter em vista que dimensões menos reconhecidas como políticas são políticas pessoais. É esse empoderamento (a sensação de que sua vida é norteada pela sua vontade, pelos seus desejos, pelo seu ser completo) que possibilita manter-se sã a cada encontro com a realidade desfavorável, a violência, a cruz de malta preta tatuada em pele branca, o desrespeito e as "questões de opinião".
Quando você tem consciência disso tudo, no mesmo ritmo que luta lá fora, diariamente, quando vai estudar e trabalhar, tem que sobreviver plenamente à consciência do afeto e de outros pontos que a vida proporciona. Hoje em dia, nosso compromisso é para além da sobrevivência do corpo, temos o compromisso diário com a dimensão pessoal/política das nossas próprias emoções.
Experimente um pouco desse ritual e proponha muitos outros a si mesma:
Gilberto Gil.
Acústico MTV Gilberto Gil
Gilberto Gil.
Kaya N'gan Daya
Cidade Negra
Acústico MTV Cidade Negra
Paula Lima
"Tirou onda" in Samba Chic
Elza Soares
Do cóccix até o pescoço
REFERENCIAS
[1] LORDE, Audre. Textos escolhidos de Audre Lorde. [Tradução de tatiana nascimento] Disponível em : <we.riseup.net/assets/171382/AUDRE%20LORDE%20COLETANEA-bklt.pdf>. Acesso em 12 set. 15.
[2] hooks, bell. Vivendo de amor. [ Tradução de Maísa Mendonça] Disponível em: <arquivo.geledes.org.br/areas-de-atuacao/questoes-de-genero/180-artigos-de-genero/4799-vivendo-de-amor>. Acesso em 12 set. 15.
[3] Nos agradecimentos do show, Marisa Monte fala do show como "celebração da vida através da música" . MONTE, Marisa. Memórias, Crônicas e Declarações de Amor. Disponível em:<www.youtube.com/watch?v=ZSyuG4adHPA>. Acesso em 12 set. 15.
[4] Acredito que a teoria é tanto uma política quanto um elemento essencial para a prática política, como um fluxo de retroalimentação. Teoria é ação e ação é teoria.
Preta, Nerd & Burning Hell
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