Black Lightning – 1x02 – LaWanda: The Book of Hope
Segundo
episódio da série e continuamos sólidos quanto a qualidade de roteiro. O piloto
de qualquer série serve como cartão de entrada, existe para mostrar quem são
esses personagens e como serão as dinâmicas que vão ser exploradas. E agora no
segundo episódio que o trabalho começa de verdade.
Existe
uma polarização na vida de Jeff. De um lado você tem Lynn, a ex-esposa e amor
da vida dele, com a idealização de que não é preciso ser um vigilante para ser
um herói, que é possível transformar aquela comunidade negra sendo um pai de
família e diretor de colégio. Do outro lado tem o Gambi, que é alfaiate e braço
direito do Raio Negro, lembrando que aquele herói surgiu por uma razão e que a
criminalidade cresceu assustadoramente na comunidade depois que o mesmo se
aposentou.
O
mais estranho é que eu entendo os dois lados, na mesma proporção que sei que os
dois lados estão errados. O Gambi pode argumentar o que for, mas a raiz do
problema não está em um chefe do crime. Nunca esteve, não enquanto vivemos em
uma sociedade economicamente desigual que ostraciza pessoas com base na sua
raça, etnia, religião, gênero ou sexualidade. Essas são questões que nem mesmo
o Superman ou a Mulher Maravilha serão capazes de resolver.
É
nesse sentido que Jeff Pierce, o diretor, pode mudar o mundo e salvar vidas que
Raio Negro nunca poderia. Por que ele é um formador e um educador, em sala de
aula podemos conversar com os estudantes e fazer com que eles entendam de onde
vem essa desigualdade e juntos construir caminhos para que a nossa sociedade
cresça menos preconceituosa. É utópico e demorado, nem todo mundo vai escutar e
nem todo mundo vai entender. Mas se gradativamente criarmos pessoas menos
preconceituosas e mais engajadas política e socialmente, uma hora teremos uma
chance.
Acontece
que pessoas estão morrendo agora. Garotas são forçadas a se prostituir e ficar
longe de sua família e bons policiais estão de mãos atadas sem ter provas e
maus policiais estão acobertando criminosos ou parando negros inocentes por que
podem. Uma gangue está tomando conta de uma cidade inteira e dando falsas
promessas para jovens que não viam qualquer oportunidade de crescimento. Nesse
ponto o Raio Negro é necessário.
Como
LaWanda disse, por que o Raio Negro não libertou nenhuma das outras garotas que
estavam naquele motel? Um motel que voltou a funcionar como prostíbulo em menos
de 24 horas depois da polícia dar a batida no local. Se eu tivesse poderes para
de alguma forma intervir e salvar uma vida que fosse, como eu poderia dormir a
noite sem fazer nada? Eu, Camila Cerdeira, não conseguiria.
Como
eu disse, eu entendo ambos os lados. Logo no começo do episódio vemos como
utilizar seus poderes afeta Jeff, de fato chega a lembrar um viciado tendo uma
crise de abstinência. Vimos flashback dele banhado em sangue em uma banheira. É
compreensível que Lynn não queria ver o homem que ela ama morrer, mesmo que
seja por uma causa nobre. Sou filha de militar e independente de quão ruim seja
minha relação com meu pai, estou contente que pela constituição o Brasil não
entra em guerra e meu pai não serve em um quartel que manda tropas para missões
de paz por que eu sei que meu pai vai estar em casa em segurança no final do
dia.
Além
disso, temos outros pontos sendo explorados. Anissa é um deles e eu acho que
nunca fiquei tão contente em toda minha vida. A representação de mulheres que
amam mulheres tem progredido imensamente. Só no universo de séries de Super
Heróis temos Alex Danvers e Sara Lance, uma mulher lésbica e outra bissexual
respectivamente, que retratam o que é ser uma mulher não hetero
maravilhosamente bem, meu único problema é que elas são absurdamente brancas.
Eu não. É difícil encontrar representação de mulheres não heteros e não
brancas, especialmente quando se trata de mulheres negras. O exemplo que me vem
a cabeça terminou morta pelos roteiristas (Sim, Orange Is The New Black eu
estou olhando para você e eu nunca vou superar). E aqui está Anissa na cama,
nua com a namorada numa cena simples e não hipersexualizada onde mostra duas
mulheres negras se amando. É isso que eu quero, é isso que eu almejo para minha
vida. E que por mais que eu ame The Fosters eu quero saber que eu posso ter um
amor sem obrigatoriamente envolver uma pessoa branca na relação.
Claro
que pelo pouco visto essa não é uma relação simples. Anissa tem relutâncias em
trazer a namorada para vida pessoal, bem como se incluir na vida pessoal da
namorada. O que pode ser um reflexo de como ela cresceu com a pressão de ser a
filha perfeita e se relacionar com mulheres não estava na cartilha de filha
perfeita que a gente recebeu, eu consigo me relacionar com isso. E a namorada,
espero que deem um nome para personagem logo, pareceu mais focada em concertar
Anissa do que propriamente ouvir o que ela estava dizendo.
Já
Jennifer lida com questões bem diferentes. Ela tem que seguir os passos de
pessoas que são idolatradas pela comunidade a qual está inserida ao mesmo tempo
que como adolescente precisa achar seu próprio caminho. E no meio disso tudo
ela acaba caindo numa briga de gangue, sequestrada e tendo sua vida posta em
risco. Qualquer pessoa teria o direito de ficar emocionalmente balançada, uma
adolescente então. Eu sinto que essa relação dela com não-decorei-o-nome-dele
pode ser uma forma dos roteiristas trazerem um pouco do que era o personagem do
Raio Negro nos quadrinhos quando surgiu. Esse garoto negro jovem tentando deixa
para traz os problemas da comunidade com a corrida.
Como
disse no começo, o roteiro da série continua bem sólido. E estou gostando do
desenvolvimento que tem sido feito. Os roteiristas têm batido nas teclas certas
e o terceiro episódio pelas imagens que já vi parece continuar nessa mesma
direção.
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