CÍRCULO DE FOGO: A REVOLTA é tão legal quanto parece!
Em Círculo de Fogo: A Revolta, John Boyega encarna o protagonista Jake Pentecost (Imagem: Divulgação) |
Por Anne Caroline Quiangala
A HISTÓRIA ATÉ AQUI
Círculo de Fogo: a revolta (Pacific Rim: Uprising) é uma distopia que se passa em 2035, dez anos após o primeiro filme, no qual a humanidade havia derrotado os Kaijus (monstros de outra dimensão saídas da Fenda, no Oceano Pacífico projetados por alienígenas Precursores). Com o fechamento da Fenda, restou aos terráqueos o medo desses monstros retornarem e, portanto, a vigilância se tornou prioridade.
No intuito de proteger o que resta de seu mundo, a PPDC renasceu numa escala global com uma geração multicultural de Cadetes treinados para se tornarem pilotos dos robôs gigantes (Jaegers), a única força capaz de conter os Kaijus.
Cabe lembrar que foi o pai de Jake Pentecost (John Boyega), Stacker Pentecost (Idris Elba), quem se sacrificou no primeiro filme para o fechamento da Fenda; desse modo, após a guerra, o rapaz passa de "sombra do pai" a um rebelde em conflito com a lei. Durante a tentativa de roubar peças de Jaeger, Jake conhece Amara (Cailee Spaeny), uma adolescente que se tornou orfã durante a guerra e vivia exilada, ciente de que os Jaegers não a salvariam. Em resposta à hostilidade do contexto, ao medo e à falta de proteção do PPDC, Amora construiu sozinha sua pequena máquina, Scrapper.
Uma vez preso, Jake é convencido pela irmã, alto oficial Mako Mori, a treinar uma equipe de cadetes em troca de ter a queixa retirada. Neste meio-tempo, somos apresentadas a um novo inimigo, o Obsidian Fury bem como a revolta dos drones remotos das Indústrias Shao. O desafio passa a ser então, entender a causa do conflito Jaeger versus Jaeger.
Marechal Quan, Amara, Jake e Nate (Imagem: Divulgação) |
SOBRE EXPLOSÕES E CONCEITOS
É preciso lembrar que Pantera Negra elevou o nível de expectativa a respeito da presença de personagens negros em blocknusters. Digo isso porque meu grau de exigência nunca foi baixo, mas ultimamente, os filmes de ação que se propõem a aderir ao rótulo de feministas (Tomb Raider e Red Sparrow) apresentam o "mau" como um homem branco ao mesmo tempo que inserem subtextos ofensivos. Pra mim, por mais que haja questões a respeito da representação de personagens femininas racializadas, não foi um problema central em Círculo de Fogo 2, porque não aprofundar determinada personagem é diferente de usar a superficialidade para ofender. Além do mais, há mensagens bastante importantes para o momento em que vivemos.
A sequência de Círculo de Fogo, protagonizada por Boyega, mostra as nuances afetivas, humor, carisma e charme do personagem e sua progressão pessoal. Seu início como ladrão não é resumido à um juízo de valor que associa o ato à degradação moral, muito pelo contrário. Todas as escolhas e atitudes são movidas pela sua tentativa de encontrar o próprio caminho e isso acontece numa junção de vontade, ação e destino.
A base do filme é a energia do protagonista, que vai da autopiedade à generosidade e, assim, ensina aos mais jovens - em especial Amora - sobre a importância de usar os talentos para o bem comum. As sequências nas quais pilotos dividem o casulo para controlar os robôs gigantes são particularmente divertidas e belas, tanto pela coreografia, quanto pela mensagem sobre a importância da união de pessoas comuns interessadas em fazer a diferença. Por mais que a mensagem central possa ser superficialmente reduzida a um clichê, acredito que o aprofundamento dos personagens e das relações enriquece as cenas de luta, as explosões e destruições - devo dizer, impecáveis.
A premissa de que os Jaegers só podem ser comandados coletivamente por indivíduos que tenham vínculo emocional já transmite,organicamente, uma importante mensagem sobre pluralidade. |
As lutas se encaixam perfeitamente na história sem nenhuma aresta. Os efeitos visuais são potentes, mas não são o único grande trunfo do filme, afinal sua potência é amplificada pelo pacto que nós fazemos como observadoras daquela narrativa sobre pessoas comuns. A ansiedade conferida pela condição vulnerável de Jake, Lambert e a equipe de cadetes, mostra o poder que a obra tem de nos conectar com cada personagem, sobretudo com a condição de ostracismo de Amara que a levou a desenvolver suas próprias técnicas de sobrevivência.
Outras personagens femininas, a despeito de não terem grande destaque na história, mostram uma diversidade de comportamentos, estéticas e crenças mais próxima do real porque não pretendem forjar um modelo de mulheridade. Cada uma representa experiências que não focam o gênero em primeiro plano, ao contrário, as marcas da diferença não são estigmas nem idealizações duma superioridade moral. Outro ponto é que, embora não tenhamos Negras em destaque, houve uma preocupação em focar na força da chinesa Liwen Shao, CEO da Shao Industries, que supera o estereótipo passivo, silencioso e estritamente sensual da mulher asiática na cultura pop.
Liwen Shao (Jing Tian) é uma líder inteligente e altiva, mas sua vulnerabilidade mostra que ela vai além da racialidade e do gênero. |
JOHN BOYEGA PRODUTOR E PROTAGONISTA
A maior parte do público conhece John Boyega como ator, mas neste longa ele também assina a produção que se mostrou plurivocal e realmente colaborativa. O foco na humanidade é radicalmente diferente do que costumamos ver, tanto porque foge à lógica antropocentrista, quanto por levar a questionarmos: e se os Kaijuns dialogassem? Ou: curioso como os Precursores representam o nosso maior temor, atacam a pleno vapor a vulnerabilidade humana de forma tão semelhante aos gigantes capitalistas dos nossos tempos, não é?
Essa compreensão política é complementada pelo compromisso de Boyega com representatividade. A imagem é importante, mas o modo como ela é construída é o que realmente define o modo como as crianças serão motivadas. O comprometimento em mostrar uma jornada de herói encarnada por um jovem negro que seja profunda, desenvolvendo as conexões sólidas e não-hierárquicas com mulheres fortes, marcam um novo lugar de fala nos filmes de ação, dando um passo além do que foi possível ao também inspirador Wesley Snipes.
Círculo de Fogo: A Revolta mostra um mundo futuro tal como o nosso presente: fraturado e ameaçado por destruidores gigantes incapazes de argumentar. Impregnado de emoções, lutas, explosões e estilhaços, Círculo de Fogo 2, mostra que sua pretensão é meramente a de fazer enxergar a importância da comunicação e do trabalho em conjunto, independente de onde veio ou de quem você seja. Não é um clássico cult, nem pretende ser, afinal, diversão é uma emoção tão digna quanto qualquer outra!
Posso dizer enfim que, mesmo não sendo entusiasta de filmes de ação, depois de assistir Círculo de Fogo: A Revolta, fui convencida de que juntar a mensagem de esperança, a cooperação e fraternidade entre pessoas de diferentes backgrounds e masculinidade negra saudável é perfeitamente ajustável às explosões, às cores e ao modo apaixonado (e não esquemático) das lutas. Assim, a sequência não só emocionou, como me fez pensar e divertiu bastante. O filme é tão legal quanto parece!
FICHA TÉCNICA
- Direção: STEVEN S. DEKNIGHT
- Roteiro: STEVEN S. DEKNIGHT, EMILY CARMICHAEL, KIRA SNYDER e T.S. NOWLIN
- Elenco: JOHN BOYEGA, SCOTT EASTWOOD, JING TIAN, CAILEE SPAENY, RINKO KIKUCHI, BURN GORMAN, ADRIA ARJONA, MAX ZHANG, CHARLIE DAY
- Produção: LEGENDARY PICTURES
- Distribuição: Universal Pictures
Círculo de Fogo: A Revolta estréia hoje, 22 de março de 2018, nos cinemas.
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