Acadêmicas do Horror Negro: Raça e Gênero nas narrativas de zumbis

O presente texto é a tradução do texto Horror Blackademics: Race & Gender in the Zombie Narrative, em Graveyard Shifit Sisters. O texto é a sistematização de um artigo da Dra. Kinitra Brooks (2014), cujo título em português, seria: "A importância das intersecções negligenciadas: raça e gênero em narrativas e teorias contemporâneas sobre zumbis".
Tradução para o português por Tainá Elis e revisão por Anne Quiangala
Palavras-chave:
olhar opositivo – uma forma ativa de observar a mídia, particularmente como alguém que é uma mulher Negra e, analisá-la de forma que desafie as simplicidades dualistas que, geralmente, apoiam a mulheridade branca para o prazer masculino heteronormativo.
percepção textual democrática – prioriza e expande a ideia de que a “maioria dos espectadores [deve] incluir as experiências de observadoras femininas”.
horror zumbi/ teoria zumbi contemporânea – enquanto George Romero focou no zumbi como uma reflexão para nossa realidade comportarmental, novos narradores, “após o ataque inicial de sangue, horror e vísceras, os zumbis tornaram-se pano de fundo de gemidos, um perigo sempre presente para as personagens da narrativa e um importante motivo de preocupação, mas raramente o foco principal do drama psicológico em curso.” É “o estado mental e físico dos sobreviventes” que move a história como um todo, sendo uma alegoria para a condição humana.
Abordagem:
Teoria feminista negra – “não se pode privilegiar as identidades de raça e gênero uma sobre a outra, pois ambas afetam profundamente a mulher negra, reforçando-se mutuamente como opressões interligadas, que trabalham ativamente contra a autorrealização das mulheres negras.”
Tese:
Utilizando a teoria de bell hooks sobre o olhar opostitivo e a sua resistência ao “violento apagamento da mulheridade negra nos filmes”, Dra. Brooks “argumenta que existe um aumento no número de narrativas zumbis contemporâneas, que apresentam e centralizam caracterizações significativas e complexas de mulheres negras”. Existem certos exemplos em textos de terror contemporâneos que desenvolvem e propõem “meios alternativos para estimular a identificação participativa do público, um olhar opositivo” que expande a teoria zumbi com uma exploração de “intersecções de raça e gênero”.
- A presença de uma mulher negra no horror “questiona e subverte a normatividade da branquitude na teoria feminista do horror e a normatividade da masculinidade na teoria da monstruosidade negra”.
Pontos de Discussão:
– Quando apenas o gênero é considerado: Brooks utiliza a teoria da “Final Girl”, de Carol Clover, para demonstrar as suas falhas problemáticas, em relação às personagens femininas negras, nesse espaço. Um dos pontos principais para determinar uma “Final Girl” é que ela é, geralmente, codificada como masculina no que se refere ao nome, ao maneirismo, etc. Isso não pode ser utilizado tão facilmente ao analisarmos mulheres negras devido às implicações históricas da negritude de uma mulher ser definida como “inerentemente masculina”, ou seja, “muito exigente, muito rigorosa, muito desconsiderada”, indesejável, e a mulher negra em si, como uma pária, nunca adequada para a feminilidade. O racismo sistêmico nunca garantiu às mulheres negras a habilidade de serem percebidas como mulheres, portanto, o princípio da “Final Girl” não é nada radical, quando aplicado às mulheres negras, sendo inclusive prejudicial e perpetuador da supremacia branca.
– Quando apenas a raça é considerada: os filmes de terror de Blaxpoitation focam na “experiência do homem negro” e mantêm a noção sexista da “monstruosidade da mulher negra” como uma “mulher negra forte” que nega ainda mais a humanidade das mulheres negras. A presença da mulher negra no horror “complexifica” a “existente teoria da monstruosidade negra” porque o monstro negro (masculino) ganha uma história muito mais completa baseada na empatia, já que sua forma monstruosa dupla e transformação de vítima em herói, a partir de uma estrutura racista, o torna emblemático na demonstração da necessidade da sua erradicação.
- Se a maioria das narrativas de horror que consumimos de concentram ao redor das ansiedades do homem branco, então é mais comum que suas “normalidades sejam ameaçadas” por suas conceitualizações de “Monstro” (mulher branca, homem negro) e que a mulher negra seja o “não-Outro” (abaixo da mulher branca e do homem negro), que geralmente não é sequer encontrado nessas narrativas.
- Mulheres negras protagonistas em histórias de zumbis são geralmente saturadas com estereótipos simplistas de “mulher negra forte”, que prejudica a “permeabilidade de identificação” (a habilidade da audiência de se identificar investindo emocionalmente em uma personagem), que existe com as “Final Girls” descritas por Clover. Porém, o criador de The Walking Dead (Robert Kirkman) e o diretor de Extermínio (Danny Boyle) criaram elementos estruturais para subverter o estereótipo, expandindo-o para desbloquear uma multiplicidade dentro das protagonistas negras nos seus trabalhos.
Exemplos:
Selena (Noamie Harris), Extermínio (2002) uma “nova abordagem da final girl”
Michonne (Danai Gurira), The Walking Dead (2012-2017), é uma “protagonista vítima de estupro, em busca de vingança” racializada.
Questões de Discussão:
Por que narrativas de zumbis são as melhores formas de explorar as complexidades das mulheres negras e da mulheridade negra? Por que não?
Como este trabalho de Brooks faz uma transformação na forma como nós consumimos, lemos e examinamos narrativas de qualquer mídia? Quando podemos reconhecer a falta, ou a “suposição do padrão de branquitude”, e de que maneiras podemos analisar criticamente e, então, desenvolver uma maneira inclusiva de engajar com a mídia?
Você consegue argumentar sobre como filmes de horro negro como Abby e Inferno Branco, conforme mencionados, superam a narrativa simplista da “monstruosidade das mulheres negras”? Ou por que não superam?
Quais são os traços encontrados na Michonne que combinam com a sua identidade como negra e mulher, dentro do contexto histórico estadunidense?
Quais são os traços encontrados em Selena que criam uma definição mais ampla de “Final Girl”?
Leituras Adicionais:
“The Oppositional Gaze: Black Female Spectators“, de bell hooks
“Cannibalizing Gender and Genre: A Feminist Re-Vision of George Romero’s Zombie Films“, de Natasha Patterson
“Her Body, Himself: Gender in the Slasher Film“, de Carol J. Clover
“Normality is threatened by the monster: Robin Wood, Romero, and Zombies“
Pretend We’re Dead: Capitalist Monsters in American Pop Culture, de Annalee Newitz