Loving – Quando até o amor é um problema racial
Um típico casal do interior se apaixonam, engravidam, ficam felizes, ele a pede em casamento, ela aceita, eles se casam e… o que tem de errado nisso? Estamos falando de um casal interracial que vive em uma cidade da Virgínia nos EUA em 1958, numa época que era proibido o entrosamento, quiçá um relacionamento afetivo entre “raças” diferentes. Absurda essa segregação explícita, não é mesmo? Ela existiu.
Esse longa me lembrou muito o filme francês também indicado e vencedor na categoria Melhor Filme Estrangeiro do Oscar de 2012 Amour de Michael Haneke. Não por contar uma história de amor e sim pela narrativa morna. Loving é um filme de drama dirigido pelo jovem Jeff Nichols e conta com um roteiro muito bem desenhado pelas atuações, a fotografia que explora muito os elementos da natureza, o desenho de som muito bem construído que compõe os sentimentos dos personagens e poucas falas.
Em 2011 a HBO produziu o documentário que conta essa mesma história The Loving Story e um dos fatores que mais me chamou atenção na direção de Nichols foi a sua fidelidade nos fatos, sejam pelas fotos, feições, roupas, lugares e cenas, a equipe foi muito feliz e estão de parabéns. Ao comparar a atuação de Negga e as cenas de Mildred Jeter na época, você fica de queixo caído porque ela conseguiu extrair não apenas os trejeitos e o modo de se expressar, é perceptível como conseguiu captar os sentimentos, a intimidade de Mildred, dessa forma você percebe o quanto ela merece essa indicação.
Eles não eram ativistas, nem membros do Panteras Negras ou ACLU, apenas queriam exercer o direito pleno de viver um casamento saudável e normal perto de suas famílias. E é dessa forma que funciona, tomando para nossas realidades. Nós queremos ter uma vida em paz, sem medo.
Apesar de tudo que citei acima, esse é um filme produzido por pessoas brancas, para pessoas brancas. Ele fala das pessoas brancas que ajudaram no caso, e de certa forma mostra que essa vitória só houve êxito por luta de pessoas brancas e resistência do casal. Sabemos que não é bem assim, por trás disso existe muito sangue e suor preto derramado. O filme não mostra sobre as nuances que influenciaram e ajudaram a concretizar essa guerra de um casal contra um estado, que eram os movimentos de direitos civis, porque como já citado acima, essa foi uma produção feita para ser fiel à história, sem falar do que estava em volta disso tudo, tanto que nem os personagens coadjuvantes tem uma participação grande.
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O casal original, Richard e Mildred |
Se pensarmos bem, até hoje os casais interraciais passam por problemas, afinal o problema é a pessoa negra estar tomando o lugar de uma pessoa branca, não é mesmo? Eu por exemplo sou casada com uma mulher branca e sinto a diferença quando me respeitam por estar com uma pessoa branca e dela ter que passar (por tabela, como ela diz) por situações racistas apenas por estar com uma mulher preta. Isso nunca vai acabar, infelizmente o racismo estrutura a nossa sociedade. Mas saber que um casal teve a coragem de encarar uma injustiça estatal e constitucionalizada nos dá forças para continuar nas nossas lutas cotidianas.
Uma narrativa importante com ótimas atuações, mas como tu disse, é ainda a fábula do homem branco trabalhando para o fim da segregação. E assim com a redatora desse artigo, também vivo em um relacionamento inter-racial e hoje é triste que haja preconceitos dos dois lados, seja do “the man” ou em certa ala da militância preta 🙁
No mais excelente trabalho no site, já leio há um tempo só não havia comentado, abs